Despachos Judiciais

 
 PROCESSO 1284/2010 AÇÃO CIVIL PÚBLICA

Despacho Proferido C O N C L U S Ã O Em 11/02/11 faço estes autos conclusos ao MM. Juiz de Direito JOÃO MÁRIO ESTEVAM DA SILVA. Eu, ______________, Escrevente, digitei. Vistos Trata-se de AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA COM PEDIDO LIMINAR DE AFASTAMENTO ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO contra GERSON DE OLIVEIRA, ANDRÉ LUIS DE CABRAL OLIVEIRA, JOSÉ AUGUSTO DA SILVA, EDUARDO DE SOUZA CÉSAR, DELCIO JOSÉ SATO, e VERA LUCIA RAMOS, todos qualificados nos autos. Despacho inicial às fls.21/46. Aditamento às fls.135/136. Em apenso os autos do Inquérito Civil no 14.0464.0000139/10-8. Os requeridos foram notificados às fls.81. O Ministério Público juntou os documentos de fls.83/116 (fls.118). A Municipalidade peticionou às fls.143 nos termos do art.17, §3º, Lei no 8.429/92. Juntou os documentos de fls.144/162. Veio aos autos o ofício do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (fls.1425/1429). As defesas preliminares foram apresentadas tempestivamente, conforme certidão de fls.1873. José Augusto da Silva arguiu preliminares de inadequação da via eleita, cerceamento de defesa nos autos dos inquéritos civis nos 126/05 e 139/10, invalidade da denúncia anônima e prejudicial de prescrição. No mérito sustentou a inocorrência dos fatos alegados na inicial (fls.124/135), negando veementente qualquer participação no suposto esquema. Juntou os documentos de fls.130/135. Eduardo de Souza César ofertou defesa de fls.164/192. Não arguiu preliminares. No mérito, sustentou a que desde 2008 o Município investiga as supostas fraudes descritas na inicial, e que tais investigações ocorreram informalmente, antes das apreensões, sem sindicância, para evitar risco de destruição de provas, e que tais providências informais foram iniciadas depois de o funcionário Alessandro Terra Palhares suspeitar de alguns processos. Aduz que referidas informações e planilhas foram encaminhadas ao Ministério Público, sendo que dos 31 casos descritos na inicial, apenas 14 constituíram fraude. Sustentou a inexistência de participação de funcionários da dívida ativa no suposto esquema (José Augusto e André). Questionou a não inclusão de Luciana Vieira e Marcial Pereira da Silva no pólo passivo da ação. Relativizou a credibilidade das afirmações prestadas por Marcos Guerra, declarado inimigo político do Prefeito. No mais, no que tange à lei de responsabilidade fiscal, sustenta que o disposto no artigo 14 não é aplicável às hipóteses de leis de incentivo fiscal que objetivam aumento de receita ao município, e não renúncia. Alega, por fim, que os valores atingidos são oriundos de créditos tributários vencidos e, portanto, não haveria obrigatoriedade de inclusão na lei orçamentária. Juntou os documentos de fls.194/1322. Gerson de Oliveira apresentou a defesa de fls.1335/1341. Postulou pela rejeição da inicial sog a alegação de inexistência de ato de improbidade administrativa. Aduz que é titular da empresa GP muito antes de ser vereador, e que jamais fez uso de sua função pública para o exercício de suas atividades empresariais. Sustentou que as declarações de Alvelino não são verdadeiras, e que o autor está sendo manipulado pelos opositores políticos. Afirma que as falhas no sistema da Prefeitura já haviam sido apontadas, no ano de 2005, sem qualquer providência, pelas pessoas de Rodrigo Cursino (fls. 98/99) e Joelsivan da Silva Bispo. Não juntou documentos. André Luis Cabral de Oliveira em sua defesa de fls. 1342/1346 reiterou os argumentos tecidos por Gerson de Oliveira, mas postulou pela rejeição da inicial porque teria deixado de ser funcionário da Prefeitura no ano de 2004. Não juntou documentos. Vera Lúcia Ramos defendeu-se alegando inexistência de ato de improbidade administrativa por inexistência de dolo de sua parte (fls. 1347/1355), porquanto pugnou pela rejeição da inicial. Disse que as cópias do processo SF 8493/09 estão incompletas e que, ao contrário do que consta, houve um estudo profundo do problema apontado na inicial, mas esclareceu que a situação relatada naquele procedimento não se confunde com as fraudes que deram ensejo ao presente feito. Disse que as planilhas constantes dos autos foram produzidas pela Prefeitura, não havendo que se falar em omissão. Juntou os documentos de fls.1356/1403. Délcio José Sato apresentou a defesa de fls.1445/1461. Não arguiu preliminares. Pugnou pela rejeição da inicial argumentando não possuir competência para a prática dos atos descritos na inicial, tampouco para fiscalizá-los. Disse que não houve omissão dos órgãos municipais, pois as planilhas foram produzidas por servidores municipais em investigação interna iniciada muito antes da iniciativa do Ministério Público. Impugnou as declarações de Marcos Guerra, o qual se apresenta como inimigo declarado do Prefeito. Afirmou a inexistência de atos de improbidade administrativa e a ausência de dolo, pois dos 31 acordos listados na inicial, em 14 apenas houve erro de cálculo. Juntou os documentos de fls.1462/1869. Réplica do Ministério Público às fls.1877/1887. Veio aos autos novo ofício do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo contendo relatório de auditoria (fls.1890/1909). O Ministério Público juntou novos documentos às fls.1911/2620. Veio aos autos novo ofício do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (fls.2630/2648). Tendo em vista que aos autos foram juntados novos documentos pertinentes ao objeto da lide, e com vistas a evitar futura argüição de nulidade, defiro às partes o prazo de 05 (cinco) dias para que se manifestem acerca dos aludidos elementos de prova acrescidos. É o relatório. Fundamento e decido. Inicialmente, rejeito a preliminar de inadequação da via eleita. O Ministério Público, ao atuar no interesse coletivo e promover ação para a reparação de eventual desfalque de recursos públicos, é parte legítima, nos termos autorizados pela Constituição Federal, e não há fundamento legal ou doutrinário a diferenciar “ação civil pública” da ação objetivando o ressarcimento do dano por improbidade administrativa. É hoje incontroverso que por “ação civil pública” se compreende toda demanda objetivando a tutela de interesses metaindividuais, dentre os quais a integralidade do patrimônio público, já que a legitimação ativa não é exclusiva do Ministério Público, mas concorrente com outras pessoas. Trata-se a espécie de ação civil pública por atos de improbidade administrativa, e não de ação tendente à cobrança de tributos, como se quer fazer crer. Igualmente, rejeito a preliminar de carência da ação por impossibilidade jurídica do pedido, pois a pretensão do Ministério Público encontra lastro na Lei nº 8.429/92 e na Constituição Federal. O interesse de agir do Ministério Público é manifesto o porque sua pretensão é relativa à violação da lei e dos princípios constitucionais inerentes à função administrativa. Some-se, ainda, que se queda remansosa a legitimidade do “Parquet” pois visa proteger o patrimônio público contra atos do administrador, como bem ressalta a Súmula 329 do Superior Tribunal de Justiça: “O Ministério Público tem legitimidade para propor ação civil pública em defesa do patrimônio público”. Em que pese a expressa previsão do artigo 17 da Lei n° 8.429/92 e no artigo 5º da Lei n° 7.347/85, a fim de que não paire qualquer dúvida acerca da legitimidade do Ministério Público para propositura da presente ação, é valido colacionar o seguinte: “(...) O MINISTÉRIO PÚBLICO, em hora oportuna, teve ampliadas suas funções institucionais, na forma do disposto no artigo 129 da Constituição Federal, e a ação civil pública, disciplinada pela Lei nº 7.347, de 24/7/1985, com as alterações introduzidas pela Lei nº 8.078, de 11/9/1990, constitui instrumento apto e eficaz para sua atuação para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivo. Como ressaltou o Colendo Superior Tribunal de Justiça: ‘Após a vigência da CF/88 foi ampliada a legitimidade ativa do Ministério Público para propor ação civil pública, especialmente, na defesa dos interesses coletivos, presentes em tal concepção de modo inequívoco, o de zelar pela integridade do patrimônio estatal’ (Recurso Especial nº 190.886/MG, Relator Ministro JOSÉ DELGADO). “O MINISTÉRIO PÚBLICO está legitimado para exercer ação civil pública, em defesa do patrimônio público. Conforme entendimento doutrinário e jurisprudencial, o Ministério Público tem legitimidade para propor ação civil pública em defesa do patrimônio público, visando ao ressarcimento de possível dano ao erário” (Recurso Especial nº 190.693/SP, Relator Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS)” (TJSP, Apelação Cível nº 99.570-5/8, Pederneiras, 1ª Câmara de Direito Público, Rel. Des. Luis Tâmbara). A legitimação ativa para o ajuizamento de ação civil pública para defesa do patrimônio público municipal, é conferida ao Ministério Público pelo artigo 129, inciso III, da Constituição Federal, que dispõe que “são funções institucionais do Ministério Público promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social...”. Também, o artigo 17, da Lei nº 8.429/92, afasta qualquer dúvida a respeito. No mesmo sentido, do STJ: "A defesa do patrimônio público também é afeta ao MP, nos termos do art. 129, III, da CF" (Agravo de instrumento nº 97.838-GO, Rel. Min. PÁDUA RIBEIRO). Não é outro o entendimento de nosso Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo: “Ação civil pública de reparação de lesão ao patrimônio público e social, por improbidade administrativa, promovida pelo Ministério Público - Legitimidade ativa, interesse processual e possibilidade jurídica do pedido - Condições da ação presentes, no caso em exame - Afastamento das preliminares - Decisão agravada mantida - Improvimento do recurso”. (Agravo de Instrumento n.º 61.937-5 - Matão - 4ª Câmara de Direito Público - Relator: Eduardo Braga - 21.05.98 - V.U.). “ILEGITIMIDADE “AD CAUSAM” - Ação civil pública – Improbidade administrativa – Responsabilização civil de agentes públicos, bem como a declaração de nulidade de procedimento licitatório e os contratos dele originados – Objetivo – Ministério Público como parte legítima para propor a ação, visando a recomposição de danos causados ao patrimônio público – Legitimidade ativa – Ocorrência – Preliminares afastadas – Recurso improvido”. (Agravo de Instrumento n. 427.961-5/7 – Sumaré – 3ª Câmara de Direito Público – Relator: Antonio Carlos Malheiros – 25.09.07 – V.U. – Voto n. 15.238). “Improbidade administrativa – Na medida em que a "probidade administrativa" é consectário da moralidade administrativa, sendo este tópico um objetivo da sociedade como um todo, estando aí o seu conteúdo "difuso", tem o Ministério Público legitimidade para ingressar em juízo na defesa desta matéria – Recurso parcialmente provido.” (Apelação Cível nº 538.626-5/3 – Pirassununga – 1ª Câmara de Direito Público – Relator: Danilo Panizza – 6.5.08 – V.U. – Voto nº 8.762). Rejeito a preliminar de ausência do pressuposto processual. Como se anotou, não há no ordenamento jurídico qualquer imposição de instauração do processo administrativo como pressuposto para o ajuizamento da ação civil pública. Cabe ao Ministério Público proceder em juízo sobre a instauração ou não de inquérito civil, quando relevante e necessário para apuração de eventuais condutas ímprobas. O inquérito civil, todavia, tem evidente natureza jurídica de procedimento administrativo, dado o seu cunho eminentemente investigativo e inquisitorial. Ao Ministério Público como titular da ação civil pública cabe formular o juízo soberano de sua instauração ou não, embora a questão das provas e a qualificação de eventuais condutas ímprobas se submetam a controle jurisdicional. Se não instaurado o inquérito civil, nem por isso resta violada a cláusula do devido processo legal. Isso porque as leis se defendem das imputações que lhe são feitas na ação e não no inquérito civil que é a peça meramente informativa. Nessa linha, rejeito a preliminar de cerceamento de defesa argüida por José augusto, pois, conforme assinalado pelo Parquet em réplica, in verbis: “Não há na lei e tampouco no ato normativo 484-CPJ, de 5 de setembro de 2006, a obrigatoriedade de se ouvir investigados durante o tramite do inquérito, sendo certo que qualquer elemento que seja produzido e fundamente a decisão do órgão ministerial de ajuizar a ação terá o contraditório diferido para a fase judicial, tal como ocorre no presente feito em que o requerido JOSÉ AUGUSTO teve plena ciência de tudo quanto foi produzido a seu respeito, tendo tido a oportunidade de contradizer e apresentar seus argumentos de forma ampla. Trata-se, na verdade, do que a doutrina chama de contraditório diferido.” Rejeito a preliminar de ilicitude da prova. Conforme se colhe dos autos, a denúncia anônima foi acompanhada de outros elementos de provas, que também instruíram a medida cautelar preparatória no 1168/10. As providências de urgência requeridas pelo autor foram deferidas, em sede de decião fundamentada, porque presentes os respectivos requisitos legais autorizadores, bem como fortes indícios dos fatos descritos na inicial. Quanto à licitude do emprego das planilhas, nenhuma ilegalidade se evidencia, pois, conforme explica o representante do Ministério Público, in verbis: “(...) ao longo do I.C. 139/10, o qual instrui a presente ação, foi colhida a manifestação da testemunha Alessandro Terra Palhares o qual confirmou que ele, em conjunto com a testemunha Américo, elaboraram tais filtragens, razão pela qual não há que se falar em ilicitude, pois o Município autorizou seu emprego pelo MINISTÉRIO PÚBLICO.” Por fim, rejeito a prejudicial de prescrição. Contrariamente ao que pretende o requerido José Augusto, a inicial relata sua participação em suposto esquema que vai do ano de 2005 até a presente data, tornado-se irrelevante, ao menos em tese, a data em que deixou o cargo que ocupava. Não bastasse isso, estaria o requerido ocupando na Prefeitura cargo anteriormente exercido pelo correquerido André. As demais questões entrelaçam-se com o mérito e com ele serão apreciadas oportunamente. Quanto à alegada condição de Marcos Guerra como inimigo capital do Prefeito, tal fato não pode servir, desde logo, como fundamento para a rejeição da inicial, mesmo porque este é apenas um dos elementos de prova constantes no feito, além de outros que serão produzidos. Ademais, a lei processual possibilita que a parte possa contraditar a testemunha da adversa no momento processualmente adequado. Assim, adstrito a um juízo preliminar de verossimilhança e plausibilidade, vislumbro no âmbito de cognição sumária ínsito ao presente momento processual, ser admissível a ação, não considerando que as defesas preliminares ofertadas, ao menos por ora, tenham o condão de já no início do processo, rechaçar o quanto alegado pelo autor. Conforme já escrevi, fortes são os indícios de que os requeridos, ao atuarem conforme narrado na inicial, macularam os princípios da legalidade, da moralidade, da boa-fé objetiva, desrespeitando os deveres de probidade, retidão, impessoalidade, seriedade, imparcialidade, diligência e responsabilidade, em especial contra os interesses das finanças públicas desta cidade de Ubatuba. Afiguram-se ausentes motivos a ensejar a rejeição da ação ou a sua improcedência, sendo adequada a via eleita escolhida, de forma que recebo a petição inicial e, nos termos do §9º do mesmo artigo já mencionado, citem-se os requeridos para, querendo apresentar contestação, no prazo legal, com as advertências de praxe. P.I. Ubatuba, 14 de fevereiro de 2011. JOÃO MÁRIO ESTEVAM DA SILVA Juiz de Direito Titular