"Despacho Proferido:
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Vistos Somente nesta data tendo em vista a complexidade dos fatos narrados, dos documentos carreados, e da natureza dos pedidos.
Trata-se de “AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA C.C COM PEDIDO LIMINAR DE AFASTAMENTO” proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO contra EDUARDO DE SOUZA CÉSAR, e sua esposa DENISE MARIA BARBOSA MONTEMOR CESAR, SILVIO BONFIGLIOLI NETO, e sua esposa MARLI DA SILVA BONFIGLIOLI, EMERSON VILELA DA SILVA, MAURO GILBERTO DE FREITAS, e sua esposa GIOVANNA BONFIGLIOLI, IVONE ALVES ARAUJO, GRACINDA DE OLIVEIRA LEITE DE MORAES, e seu esposo OSWALDO LEITE DE MORAES JUNIOR, MARCELO SANTOS MOURÃO, e ODAIR CAETANO FERNANDES, todos já qualificados nos autos.
A inicial foi emendada às fls.262. Narra-se suposta prática ilícita imputada aos requeridos consistente em invasão e trespasse, ao arrepio da lei, de parte de área pública pertencente ao Município de Ubatuba.
Relata-se, ainda, a suposta conduta ímproba relacionada à interferência negativa dos réus na apuração dos fatos, na medida em que sonegam informações e documentos necessários à escorreita apuração, e também por enviarem documentos inúteis e diversos daqueles que lhes foram solicitados.
Eis, pois, os objetos da demanda. Segundo se decalca dos autos à fls.42, mais precisamente da matrícula no 30.102, a referida área pública corresponde a, in verbis: “Uma área de terreno com 13.421,00ms2, situada no Bairro Perequê-Açú, em..........
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Porque oportuno, é necessário pontuar que referida área de 13.421,00m2 fora objeto de doação para a autarquia estadual denominada FUMEST, por meio de escritura pública lavrada em 30/07/1972 (livro 16 – fls.33v – Cartório Local). Entretanto, porque extinta referida autarquia, a área foi revertida ao patrimônio público, conforme se colhe do teor da respectiva averbação no 1, relativa a instrumento particular assinado em 19/08/1994 (fls. 41).
Pois bem. Em 23/04/2000, por meio de instrumento particular de cessão de direitos possessórios, e sob a alegação de deter a legítima posse há mais de dez anos, SILVIO cedeu 60% (sessenta por cento) do total de sua suposta área a ADILSON VIANA e EMERSON, sendo que do referido total, 40% (quarenta por cento) foram transferidos ao ADILSON, e 20% (vinte por cento) a EMERSON (fls. 41/43).
A área cedida por SILVIO está assim descrita: “Imóvel situado em perímetro urbano, inicia sua descrição a esquerda confrontando com quem de direito, pelo rumo 05º15’39”NW, 64,53 metros, até alcançar o ponto de partida da presente demarcação, tem a gleba levantada uma área total de 2.904,10 ms2 (dois mil novecentos e quatro metros e dez centímetros quadrados).”
. Por sua vez, poucos meses depois, mais precisamente em 30/10/2000, por meio de instrumento particular de cessão de direitos possessórios, ADILSON VIANA, cedeu a EDUARDO e MAURO a área que adquirira de SILVIO BONFIGLIOLI, conforme acima narrado (40%) (fls.48/50).
Anote-se que SILVIO e EMERSON figuraram como anuentes, e que a descrição da área cedida no referido instrumento é a mesma contida naqueloutro instrumento assinado em 23/04/2000.
Imperioso destacar, desde logo, que SILVIO dizia ser o legítimo possuidor da área há mais de 10 (dez) anos (fls.60), o mesmo fazendo, por óbvio, Adilson (fls.48), mas tais declarações vão de absoluto encontro com outras informações constantes dos autos. Isso é plenamente passível de afirmação porque, em 21/09/2000, fora Judicialmente reconhecida a posse melhor posse do Município em relação à área de 13.421,00ms2.
Tratou-se de ação de reintegração de posse, proposta pelo Município de Ubatuba, em junho de 1995, contra o “Camping Clube do Brasil” (fls.77/79, 107/109 e 131/137). A ação fora julgada procedente e a respectiva sentença mantida em grau recursal (fls.139/142).
Ora, se a área de 2.904,10 ms2 cedida por SILVIO, em 23/04/2000, faz parte da área de 13.421,00ms2, como conjugar a posse de ambos, se a do Município fora reconhecida em 21/09/2000?
Além disso, porque pertinente, anoto que, em 22/11/1998, SILVIO BONFIGLIOLI atravessou petição nos autos da referida ação possessória objetivando funcionar como assistente do “Camping Clube do Brasil”, tal pretensão foi indeferida (fls.59 – cópia da sentença).
Com maior relevo e importância vem a tona a conclusão do CAEX (Centro de Apoio Operacional à Execução) no sentido de que, apesar de a área da Matrícula 30.102 ser de 13.421,00 m2, o laudo pericial levado a efeito nos autos da referida ação possessória indicara como sendo de 12.112,42m2 (fls. 189, item 4.2).
Ainda segundo os peritos do CAEX, “A pendência observada é que existe uma área de 2.904,10m2, localizada nos fundos e incrustrada na interrupção da Rua Barra Seca no Bairro do Perequê-Açú... (...) que fora comercializada e que também está sub-júdice.”
Não obstante tanta divergência, consta que, em 02/05/2003, por meio de escritura pública de cessão de direitos possessórios, os requeridos SILVIO, MARLI, EMERSON, EDUARDO, DENISE, MAURO e GIOVANNA cederam para IVONE, GRACINDA e OSWALDO, o imóvel situado no final da rua Barra-Seca, no bairro do Pereque-Açú, em perímetro urbano, desta cidade e comarca de Ubatuba, assim descrito....
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“(...) Que o imóvel está cadastrado junto a Prefeitura Municipal local, pelo contribuinte número 03.104.049-7, com seu valor venal de R$ 24.249,47 (vinte e quatro mil, duzentos e quarenta e nove reais e quarenta e sete centavos), datando o primeiro lançamento desde o exercício de 2001, em nome de Silvio Bonfiglioli Neto, conforme certidão no SF/168/2003, expedida pela Prefeitura Municipal desta Cidade, em data de 25/04/2003, que é exibida e arquivada nestas notas em pasta própria 3 (três), sob o no 291.”
É dos autos às fls.30, 34/37 e 38/39 que SILVIO BONFIGLIOLI foi chefe do serviço de tributos e, nessa qualidade, teria realizado o cadastramento da área como se particular fosse.
Prosseguindo: Segundo o Ministério Público, in verbis (fls.04/05): “Instado a se manifestar, MARCELO SANTOS MOURÃO informou que a área foi reconhecida pelo Poder Judiciário como pertencente ao correquerido SILVIO, quando o perito judicial ali nomeado o colocou na condição de confrontante na parte dos fundos do imóvel da Municipalidade (fls. 86/87 e 105/110)
Referido laudo pericial é questionado pelo representante a fls. 17 nos seguintes termos: “Se na transcrição de origem, a área da municipalidade confronta ao fundo com propriedade de Michel Swerski (v. fls. 22 e 159), como pode ser alegado durante o processo que haja outro confrontante?”
Além disso, segundo o representante, a área de propriedade da Construtora Vaicom fica localizada à direita do imóvel da municipalidade de quem olha a Avenida Abreu Sodré e não à esquerda (fls. 24/27).”
Ainda segundo o Promotor de Justiça: “Em laudo complementar, os senhores peritos do CAEX informaram que não foi apresentada planta topográfica detalhada da região invadida e que o croqui enviado para a Promotoria de Ubatuba não possuía as medidas necessárias e tampouco a correta localização da área de 2.904,10m2, sendo certo que o CAEX não possuía equipamentos necessários para realizar o levantamento (fls. 203).
Visando o esclarecimento da dúvida, em dezembro de 2009, determinou a 1ª Promotoria que a PMU realizasse o levantamento topográfico (fls. 205). Em função do reclamado pela PMU a fls. 209 (encaminhamento de documentação afeita à área em questão), conforme determinado a fls. 212, a PMU foi novamente oficiada para que atendesse o reclamado pelo CAEX, ou seja, realizar o levantamento topográfico da área em dezembro de 2009 (fls. 206).
Em maio e em julho de 2010, cobrou-se reposta do Sr. Prefeito (fls. 217 e 220). Em setembro de 2010, foi solicitada a dilação de prazo por mais 60 dias (fls. 222). A despeito de ter sido cobrado, o Sr. Prefeito deixou de encaminhar o levantamento topográfico, razão pela qual em março de 2011 encaminhou-se cópia dos autos à Procuradoria Geral de Justiça para que se apurasse a eventual prática de crime previsto no artigo 10 da Lei 7.347/85.
Finalmente, no final de março de 2011, o Sr. Secretário Municipal de Assuntos Jurídicos, ao invés de encaminhar a planta topográfica detalhada da região invadida, encaminhou planta do imóvel que nada informa quanto às exatas medidas.
Em outras palavras, há indícios de que, além de a área ser, de fato, integrante da matrícula n. 30.102, que o requerido EDUARDO, contando com auxílio de seu secretário de assuntos jurídicos MARCELO e do Sr. ODAIR CAETANO FERNANDES, gerente de cadastro técnico do Município, estarem obstruindo a investigação, deixando de encaminhar os documentos que resolveriam a dúvida, quer em favor do Prefeito e demais signatários da cessão, quer em favor da Municipalidade.”
Diante o exposto, julgo por bem deferir a produção antecipada de provas, mas não para ser produzida pela Prefeitura, e sim por perito de confiança deste Juízo. Não se afigura razoável que a perícia seja realizada por aqueles que são apontados como supostos sonegadores de informações ou prestadores de informações incorretas ou incompletas.
Com o deferimento da produção antecipada de provas, não remanesce imprescindível a medida drástica dos afastamentos pretendidos, justamente porque a realização de prova técnica por perito judicial impede possíveis interferências negativas durante a confecção dos laudos.
Entretanto, com o escopo de garantir a maior lisura possível, determino que a prova seja realizada antes mesmo da notificação dos requeridos, mesmo porque nenhum prejuízo lhes sobrevém de tal medida acautelatória. Necessário o “levantamento topográfico de todas as áreas descritas na Matrícula 30.102, nos instrumentos de cessão de direitos possessórios juntados aos autos, e da área reproduzida a fls.98.
Para a realização da perícia nomeio FABIO COSTA FERNANDES, engenheiro civil, CREA no 134589. O laudo deverá ser produzido em no máximo 15 (quinze) dias. Disponibilizem-se os autos ao referido perito, dom brevidade. Ciência ao MP. Notifiquem-se para que os requeridos apresentem suas defesas preliminares, no prazo legal. Ubatuba, 25 de maio de 2011. JOÃO MÁRIO ESTEVAM DA SILVA Juiz de Direito Titular"